A mensagem errada
Corte decidiu que algumas crianças são 'menos iguais' do que outras
Fazer sexo com meninas jovens, disse a mais alta corte criminal
brasileira no dia 27 de março, é “imoral e repreensível”. Mas um homem
que teve relações sexuais com três meninas de 12 anos em 2002, ela
decidiu, não cometeu nenhum crime. Desde 2009 a idade para
consentimento no Brasil é 14, mas na época era meramente uma presunção
que sexo com uma criança abaixo desta idade envolvia violência e,
portanto, deveria ser visto como estupro. Revertendo uma decisão
anterior de outros membros do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), os
juízes decidiram que essa presunção não poderia ser absoluta, mas
deveria ser mantida ou não conforme cada caso.
Neste caso, todas as três crianças trabalhavam como prostitutas. A
mãe de uma delas já havia dito a um advogado que a filha frequentemente
faltava à escola para se juntar às outras duas e se prostituir na praça
da cidade. Isso mostra que as meninas estavam longe de serem “inocentes,
ingênuas, ignorantes ou mal informadas sobre questões sexuais”,
disseram os juízes. Se elas eram maduras o suficiente para consentir
teve que ser decidido com referência à vasta experiência sexual delas,
não apenas pela idade.
O julgamento provocou discussões. Um comitê congressista disse que a
decisão violava os direitos constitucionais das crianças. O governo vai
tentar reverter a decisão. O presidente do STJ já se ofereceu para rever
o caso, embora tenha avisado que o julgamento foi técnico e baseado na
lei.
Prostituição infantil geralmente começa com estupro, aponta Atila
Roque da Anistia Internacional. A criança na maioria das vezes é forçada
ao trabalho. Ele teme que o julgamento possa enfraquecer as proteções
legais das crianças. “Os juízes decidiram que uma criança que foi
brutalizada se torna mais livre para fazer escolhas sexuais”, ele diz.
“Então uma criança prostituída de alguma forma não é mais uma criança”.
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prostituição infantil, geralmente começa com estrupo |
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Parte do ultraje está na questão errada, diz Juliana Belloque, uma
defensora pública em São Paulo. “As pessoas pensam que a corte decidiu
que prostitutas não podem ser estupradas. Isso não é verdade”. Segundo
Juliana, combater a prostituição infantil é uma questão de aplicar as
leis que tornam crime persuadir ou forçar menores de 18 anos a venderem
sexo.
Prostituição de menores é muito comum no Brasil. Uma pesquisa de 2006
da Universidade de Brasília, do governo federal e da Unicef encontrou
crianças e adolescentes vendendo sexo em quase mil municípios, um sexto
do total. Cidades litorâneas como Fortaleza, Recife e Rio de Janeiro são
lugares com alto índice, já que são portuárias. Em 2007 a polícia
federal disse que tinha conhecimento de quase duas mil localidades de
beira de estrada onde sexo com crianças estava à venda.
À frente da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016, o
Ministério do Turismo está promovendo as praias, a comida e a
biodiversidade brasileiras. Mas o Ministério diz pesquisar quais sites
estão usando suas marcas registradas, numa tentativa de impedir que
muitos deles promovam o Brasil como destino de turismo sexual. Ele já
escreveu para as empresas de hospedaem que abrigam 1.770 sites pedindo
que removam o conteúdo. Isso foi tornado público no mesmo dia em que o
julgamento do STJ enlameou esta mensagem.